quarta-feira, junho 04, 2008

Atento e refletindo sobre o que escrevo

Não consigo sentar e tomar um uísque na minha casa e descansar depois do trabalho. Não consigo me imaginar sentado em casa, com o sentido pleno de lar ao meu redor, com um uísque na mão e sentado no sofá sabendo que vivo atormentado por pensamentos inseguros sobre viver de música neste país. Viver de música nesse país é uma aventura. Podem dizer o que quiser, seja músico rico ou falido, seja bem sucedido ou desastrado artista, seja tocando no Carnigie Hall ou na boate mais pé sujo do Brasil, ser músico no Brasil é um desafio à moral e a fé das pessoas.
Nesse mar de generalizações e de massificações, onde ser BBB ou artista da moda, da tendência, etc, é o "must", eu vivo tendo de me definir e explicar como não tem nada de especial em ser músico, pelo contrário: o músico quando é desconhecido é faminto e quando fica famoso vira modelo e ser for um péssimo modelo é julgado publicamente e, mesmo sem ser famoso, só por ter fãs, deve à eles ser aquilo que eles projetam em sei lá o que ser e esquecem que esse músico é uma pessoa que vai ao supermercado, que pratica seu instrumento e estuda música semanalmente, que é pai de família e precisa pagar muitas contas e que, além de tudo isso, não vive uma vida comum porque viaja nos finais de semana, justo quando todos descansam, para fazer seu trabalho. E o músico não pode dar bandeira; não pode exigir nada, não pode nem ficar com uma menina, no caso dos homens, sem que alguém comente, espie, julgue, diga, opine, até mesmo se ele está com um copo de suco na mão ou uma lata de cerveja. O músico só não é comum quando está no palco. Lá é o lar do músico, um lar efêmero cheio de energias conflitantes e de volume sonoro que tem começo, meio e fim e o resto é voltar pra casa, mas muitos músicos não podem dizer que tem um lar pra retornar. E mesmo assim, continuam sendo pessoas normais que vão a farmácia na segunda-feira comprar analgésicos ou antibióticos para curar o que só umas férias curam: a alma.
Fazer uma música é outra tarefa alienígena que a todos fascina, mas que não salva a alma do músico e também não dá a ele nenhuma garantia de vida. Ser músico em um país onde não há uma legislação especial para esta classe é difícil. Mais! Onde o orgão que fiscaliza as execuções de música no país não presta conta nem pro governo e repassa o que quer pra classe musical toda, do intérprete ao compositor.
Ser músico é uma aventura. Assim como ser qualquer coisa que exige de nós uma definição que não existe porque é algo que o significado diminuí, essa vontade de explicar porque 2+2 é 4 e não outra coisa. Por que não sou historiador? Por que não sou professor?
Daí, do jeito que eu tenho que dar explicações sobre coisas que são tão inócuas em meu trabalho e deixam de lado o essencial, a música que inspira um mundo melhor, porque cobram de mim até que eu beba água, coma pão seco e sente em cadeira de plástico torta no meu camarim, as mesmas pessoas que estão buscando o mesmo que eu? Fazer algo que dê sentido a vida sem preconceitos, sem machucar ninguém, sem abandonar a si próprio às opiniões alheias e as tentações da máquina social imperialista? As mesmas pessoas que podem usufruir daquilo que trabalham para ter, seja sentar em casa e beber um uísque relaxado, seja viajar 1300km de ônibus, mal comer e entrar no palco com aquela ansiedade no estômago, seja aquela pessoa que nem sabe o que quer e mesmo assim faz alguma coisa?
Bom, neste caso, ser músico é uma sina. Eu simplesmente faço o que posso para ir de encontro as expectativas das pessoas que me conhecem pela estrada. Mas estou cansado de não responder realmente às reais expectativas das pessoas que eu conheço, pelo menos da minha parte afirmo: sou o exemplo de pessoa que não era pra ser músico. Era pra eu ter diploma universitário e salário. Era para eu ganhar mais de 10mil reais por mês. Era para eu ter carro do ano todos os anos. Foi para isso que eu fui treinado. Mas não é isso que sou. Eu sou um sonhador que pôs tudo à perder em busca de uma experiência de vida que me completasse, me permitisse hoje escrever estas linhas em defesa de todas as pessoas que estão cansadas de terem que se definir, ser isso ou aquilo. Eu sou músico porque eu sou um pouco de tudo, inclusive eu erro mais do que acerto comigo, mas não falho como ser humano e nem com minha família. Eu falho mais comigo, sacou? E não tenho um lar pra retornar, porque até isso eu pus à perder por ser do jeito que eu sou. E mesmo assim eu não desisto, nem das críticas, nem das sugestões e dos toques e nem da ignorância que é escrever isso tudo aqui. É melhor gritar do que ter cabelos brancos por stress e raiva.

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