Da forma como eu vejo, minha tatuagem é meu amuleto de proteção. Assim como tem gente que carrega o cordãozinho abençoado pelo Dalai Lama na carteira ou o dono do escapulário cristão no pescoço; até mesmo outros símbolos, assim como a tatuagem o é para os Maoris da Nova Zelândia, assim o foi para mim.
Uma gota negra de raiva e inveja me perseguia desde muito tempo. Me perseguia no sono, principalmente. E aquele incômodo espiritual foi se habituando a me acompanhar e eu ficava lá aceitando aquela raiva e inveja. No dia em que eu cansei, eu cresci um pouquinho mais, daquela perseguição infernal e, decididamente, intuí que me cicatrizando e me marcando eu estaria enfatizando o que estava sentindo, assim como os Maoris o fazem.
Para fazer a tatuagem, passei por diversos processos de observação e busca. Ir a uma loja e escolher meu amuleto em uma revista de tatuagens não era ideal. Por isso, eu mesmo fiz o desenho com a ajuda de um amigo. O tatuador é meu amigo também e se dispôs a reproduzir e fazer daquela nossa arte, ou seja, estava firmada nossa união. Não dei bola nenhuma para o fato de ter acertado data e hora para concluir aquela fase existencial breve. Porém, na hora de começar a fazê-la me ocorreu o seguinte:
"A dor é algo natural, mas eu não gosto de dor. Será que vai doer? Dizem que pouco? Será..." e fiquei totalmente focado na questão, na palavra, no sentir dor. Nem me lembro de nada, das horas, das vozes e nem do barulho de nada. Quandos as agulhas teceram seu primeiro risco, a primeira pressão do tatuador sobre minha pele com sua maquininha, e eu meditativo, focado, uno, senti uma dor imensa que quase me pôs desacordado. Foi como um choque de 220V de uns 10 segundos de duração. Um clarão, um branco.
Depois de sentir aquilo não pensei em mais nada. O amuleto ficou pronto em duas horas e eu confesso que não tenho muitos motivos para fazer outra.
Conselho: não pense ao tatuar se quiser ser tatuado. Pense na felicidade em fazer a tatuagem. E que seja por um bom motivo também.
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