terça-feira, novembro 07, 2006

o tempo rei

Vítima de um cansaço extremo. Da somatória das viagens, das esperas, dos check ins, dos hotéis e do ônibus em si. Vítima de uma escolha interessante. O Zé tinha algo especial dentro de si. Apesar de tamanho cansaço e das dores em todas as juntas, dos estalos quase imperceptíveis dos músculos esticando judiados do assento 13 do expresso de prata, apesar das noites de sono que não deixam nenhum rastro de paz ou descanço ou sonho havia uma tonelada de oxigênio pairando no ar e de tantos outros elementos a pousar suas moléculas ininterruptas que mal podia respirar enquanto zumbizando pelo colchão de casal. As noites eram as mais sufocantes. Uma noite em especial o Zé parou seus olhos para assistir a Tempo rei, filme com Gilberto Gil nos anos 80 conversando, poetisando, metafisicando com seus amigos: Caê, Jorge Amado, Pierre Vergé, etcetera. Zé pode buscar na idéia sobre o candomblé e o sincretismo bahiano muitas idéias boas, idéias coloridas e musicais que combinavam muito bem com o que ele vinha planejando como músico e compositor. Zé também sabia que uma das passagens do filme fazia um sentido danado, era quase um atestado de óbito e ou de vida de dois artistas que, fundidos ou fodidos, são elementos mágicos da música brasileira que vigora no inconsciente brasileiro: Gilberto Gil e Jorge Benjor.
Caetano Veloso e Gil dedilhavam o violão à beira-mar e, perto das pedras no poente amarelado, de um azul que esverdiava o mar filmado, o primeiro tropicalista expõe a origem da africanidade brasileira sincrética na poesia e toque de violão de Gil, expondo que negro e preto, naquele contexto, eram frutos de um mesmo orgulho humanista musical nascente e vigoroso na música de Jorge Ben, seu nome artístico na época, quer dizer, Jorge Ben era a referência que Gil tinha sobre mudar de yes pra sim. caetano expõe tudo muito bem já no alto de seus trinta e poucos anos. E o Zé pensou que Gilberto Gil estava certo, mudando, aprendendo, se ocupando em pensar nas soluções que tinham início no tom da sua pele mas que eram, na verdade, secretos estímulos culturais nos átomos que circulavam pelo Brasil naquela época, que circulam aqui até os tempos de hoje, pensava. O Zé via Gilberto ir e Jorge Benjor, esquecido em sua opção secular de não se repetir, ou não prestar atenção à necessidade humana de mudar, onde abandonando a Tábua, as meninas bonitas e o veludo rosa, a chuva e os elementos alquímicos, abandonou também todo o imaginário do fã vestido de uniforme do corinthians pra vencer o campeonato, ouvir Magnólia nos shows, o zé pensava. De repente fez sentido a ausência de Jorge Benjor na cabeça dele e por isso o Zé desbundou-se da cadeira, foi até o armário de lps e pegou o seu Tábua de Esmeraldas para uma audição. Foi pegar uma inspiração nos moldes de Gilberto Gil e continuar de onde JOrge ben parou.
Qual seria o tema de hoje, pensou o Zé? O que o benjor escreveria sobre as mulheres ou sobre o futebol... sobre a política? Achou que o poeta negro escreveria sobre o aquecimento global e pôs-se a escrever algumas idéias sobre porque o mundo e o clima mudaram tanto nos últimos anos. No começo a letra ficou meio cataclismática... nada Benjor. O Zé começou de novo o samba novo, aquecimento global que nada, atacou de calor assim que mata só faz mal, gelada não ajuda nem faz mal, o protetor que aquela mulata me emprestou é do melhor, morena quero ficar ao seu redor, redor, redor...

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