sexta-feira, outubro 24, 2008

feitoria

saiu do lombo do cavalo
o peso que o fazia suar
um peso dos diabos
daqueles que nem precisa mostrar
comida pra mais de quatro
bebida pra mais de cinco
e o cavalo cansado
nem sabia onde repousar
uma tapa no lombo
uma chicotada na orelha
umas palavras de apoio
e um cavalo com as patas pro ar
morreu!

quarta-feira, outubro 22, 2008

está quase feito

é como a chuva que vem teimando em cair aqui no Lago Norte
está quase feito e já me deu tanto trabalho
é prazeroso, mas muito cansativo trabalhar em casa
produzir do nada
(porque a melodia e a letra de uma canção vêm de algum lugar)
é uma volta em alta velocidade em um circuito profissional
e você está correndo sozinho
e só você corre o perigo sozinho
é como olhar pra cima, se distrair com algo voando
e cair em um buraco em um piscar de olhos
está quase feito, desse mesmo modo
estou esperando a hora de piscar
e seguir um novo passo

terça-feira, outubro 21, 2008

só fazer

semana passada
esta semana
é só fazer
e não deixar de fazer
e não perder tempo
nem palavras
nem espaço
nem idéias
é só fazer
dedicar-me
ser cuidado
cauteloso
semana passada foi
esta semana é trabalho
é só fazer
e não ficar com a cabeça
em outra coisa
nada a dizer
uma fonte seca
outra jorra água

terça-feira, outubro 14, 2008

irreal

Como eu já escrevi uma vez por aqui, desempenho nessa vida muitos papéis. Um deles é ser, além de artista, um dos administradores da minha própria empresa, no caso uma banda, que gera renda, empregos, contratos de diversas naturezas, sociedades, necessita de investimentos tanto pessoais como financeiros, vive altos e baixos como a economia dos bancos, depende da disponibilidade de dinheiro no mercado para gastos que vão além do supérfluo e do básico. Minha empresa, então, é cultural.
Nesse processo aprendi muitas coisas porque já tive contrato com duas gravadoras, uma grande e uma pequena, dois contratos de distribuição de obras distintos, conheço donos de rádios e radialistas no país todo, contratantes de todas as espécies. Nada disso me fez uma pessoa melhor. Esse trabalho só me fez ficar mais feroz, agressivo, impetuoso e até mesmo arrogante em alguns momentos, momentos estes que nenhum fã precisou me ver defendendo com unhas e dentes o que é meu por direito.
Já fui, com minha banda, banido de algumas rádios por causa de negócios terceirizados mal feitos, já fui dispensado de uma gravadora por falta de vendas expressivas de discos, já fomos retratados em jornáis e revistas como... nada, a mídia especializada não quer saber de maskavo.
Tenho, com a banda, duas músicas de reconhecimento nacional, sete canções trabalhadas em rádio no país todo e mais três que foram apenas vinculadas na região Sul do país. Tenho alguns prêmios recebidos pela excelência do trabalho do maskavo em prol da cultura brasileira, principalmente o título de cidadão curitibano outorgado pela câmara dos vereadores de Curitiba assinado pelo atual prefeito de lá.
E não tenho nenhum puto no bolso. A minha situação é tão irreal que eu parei de reclamar, penso que a felicidade é deixar de reclamar, sorrir mesmo da desgraça e do infortúnio. Me sinto incompetente como empreendedor, um péssimo líder dentro da banda. Sinto-me em dívida comigo mesmo; com as possibilidades reais que meus pais me deram de progredir naquilo que eu quisesse devo estar devendo para mim uns oito anos, uns cem mil reais e algumas viagens internacionais.
Sábado eu queria ouvir uma música alta, sair pra dançar, ver gente e me divertir. Mas desde semana passada que eu só tenho R$11,00 na conta. Não que isso seja mais um problema. Convidei um amigo que tem muitos contatos e disse a ele que, por todas as cervejas possíveis, eu faria uma festa em casa. Fiz. Vieram pessoas que eu nunca vi na vida, muitas pessoas com muitas bebidas e eu fiz aquilo que eu gosto: coloquei meus discos pra tocar. Meus amigos também trouxeram alguns lps deles e então nos revezamos nas pick-ups por horas e horas, o povo dançava, conversava, bebia, se divertia às custas de tudo o que tinha na festa. Teve um povo que resolveu ir lá no fundo do quintal tocar violão, legal demais. E sem nenhum puto no bolso eu me diverti o pouco que pude. Não preguei os olhos até que todo mundo fosse embora porque tive que arrumar a casa com meu irmão mais novo, promessa que fizemos a nossa mãe e cumprimos, e lavar o chão, o que não fizemos ainda.
Pra quem pensa que ouve azaração, vieram 8 meninas e uns 50 homens, os homens mais feios do mundo. As meninas também, menos minhas verdadeiras amigas, então foram 6 meninas no total. Acho que foi a reunião dos pega-ninguém ao mesmo tempo em que eu afogava a minha momentânea falência no alto volume das canções que ouvia. O total clima de despretensão da festa foi o ápice de tudo. Me pareceu que tava todo mundo sem grana fazendo vaquinha pra comprar cerveja, quer dizer, somos eu e os jovens todos falidos tentando se divertir nos embalos de bons lps e cds e sendo solidários uns com os outros porque é assim a vida, essa vida irreal que nos nivela pelo que temos e pelo que almejamos, mas não pela beleza em si que somos.
E, sem nenhum puto no bolso, de manhã cedo no Domingo me perguntei: qual será o presente do meu filho de dia das crianças? Ainda bem que a mãe dele pode comprar algo legal, me salvou dessa. Mas eu não deixo de pensar: como é que o dono da empresa é o cara mais pobre da banda?

quarta-feira, outubro 08, 2008

é coisa de bandido

Eram quase nove horas da noite quando recebi o telefonema de meu irmão mais novo pedindo socorro. Os dois pneus do lado direito do carro dele esvaziaram rapidamente no meio do eixão norte. Poderia ter acontecido um acidente pois um dos pneus chegou a explodir mas nada aconteceu de pior. Fui lá dar uma ajuda e ver o que tinha acontecido. Depois de trocarmos dois pneus, calibrá-los e recolocá-los no carro decidimos que era a hora de chamar um guincho. Uma hora depois estávamos em uma borracharia 24 horas onde descobrimos que os dois pneus tinham sido furados de forma proposital. Tinham dois rasgos de uma faca de lâmina fina no pneu de trás, o que explodiu, e um pequeno rasgo no pneu dianteiro. Meu irmão mais novo estava chocado, um pouco perplexo e se sentindo azarado, porém com saúde e um pouco de dinheiro no bolso para fazer o conserto. Se não fossem rasgos, o custo da brincadeira seria R$16. Mas como não foram furos, foram rasgos, duas câmaras e dois manchões custaram quase R$80.
Daí eu me perguntava, que bosta de gente faz uma coisa dessas, uma depredação de um bem alheio? Que bosta de pessoa é essa que passa com uma faca na rua e resolve rasgar pneus, dar prejuízos aos outros? Que tipo de bosta de gente é essa que tem raiva das propriedades dos outros? Quantos pneus de quantos carros foram rasgados como o do meu irmão? Na mesma hora parou uma kombi antiga toda reformada no borracheiro. Era um senhor de muita idade que estava lá para trocar os 4 pneus que tinham sido furados perto dali. Os 4 pneus? Daí veio a história daquele senhor conhecido por Vovô.
Semana passada ele havia reformado a kombi toda: refez a lataria, o motor, arrumou os estofados e comprou quatro pneus zero km. Custou R$2400 a reforma. No dia após ele buscar o carro na mecânica e sair para trabalhar teve seu carro roubado na frente de uma agência do banco do brasil. Na mesma noite, ele encontrou o carro todo depenado atrás de uma caçamba de entulhos. Sem motor, sem rodas e pneus, só a lataria restou. Ele foi e comprou outro motor pro carro; comprou quatro pneus e rodas meia-sola e foi trabalhar e no final do dia os quatro pneus furaram.
Azar? nem fodendo! Isso é coisa de gente bandida que não tem mais o que fazer. Só foder, foder e foder com as coisas ou com a vida dos outros.
O borracheiro trabalhou até quase meia noite no carro do meu irmão e fomos embora. Olhamos um pro outro e, com aquele sentimento de perda enorme nos ombros, retornamos calados para casa com a última frase do Vovô na cabeça: e ainda veio meu funcionário e deu uma porrada na parte de cima da kombi recém pintada, olha que merda? Ninguém liga pras coisas e pro esforço dos outros, é tudo inveja e ganância e dinheiro.
Silêncio.

terça-feira, outubro 07, 2008

auto-estima sempre em baixa?

No Brasil e no mundo é muito comum ler notícias caóticas e está ficando cada vez mais raro ler notícias otimistas. Agora mesmo, eu estava lendo notícias sobre Fórmula 1, eu gosto muito do esporte e da tecnologia e do barulho, enfim, eu gosto. Uma das notícias era de que, com a não-confirmação do grande prêmio do Canadá, nenhum país da América do Norte estará nos planos da F1 ano que vem. É verdade. Esta notícia é verdadeira. Mas depois de olhar todo o calendário dos GPs que serão corridos no ano que vem, e o do Brasil está lá confirmado para o dia 1 de novembro de 2009, percebi nitidamente que a verdadeira notícia a ser dada ao povo brasileiro não é esta, mas sim a que vem a seguir:

GP DO BRASIL É O ÚNICO DA AMÉRICA A SER CONFIRMADO

Esse é o status que o Sr. Bernie Ecclestone dá ao nosso Gp, e não mais um entre os 18 que serão disputados no campeonato. Inclusive o nosso autódromo é considerado, de longe, um dos melhores traçados do circuito e apreciado por quase todos os pilotos de f1. Então vamos comigo nesse refrão:

GP DO BRASIL É O ÚNICO DA AMÉRICA A SER CONFIRMADO

Que orgulho de ser brasileiro!

domingo, outubro 05, 2008

fútil e inútil

Em algum ponto da curva eu descobri que mudanças são importantes. Mudar é importante e a ação mutatória constante da humanidade e da natureza me fizeram entender que mudar é bom. Por outro lado, uma coisa mudou e foi para pior: relacionamentos. Não sinto mais a mesma ferocidade em me relacionar com alguém como eu sentia aos 17 anos. Esse traço psicológico forte que descobri em mim é algo que estou querendo mudar pra melhor, e logo. Depois de tudo o que eu passei, das escolhas que realmente fizeram diferença em minha existência, um relacionamento fútil e inútil é tudo o que eu não quero. E é isso que está, vem, me perseguindo desde algum tempo, pessoas que buscam em mim certa futilidade. Eu busco estar perto de gente pela qual eu sinto admiração ou tesão intelectual e, confesso, derrapei duas vezes este ano procurando em becos de futilidade algum tipo de aceitação que considero muito baixo, raso, abismal. Tenho certeza de que perdi meu tempo e não consegui nada, nada mesmo, que pudesse ser chamado de bom. Pessoas, conheço milhares delas. Algumas me apetecem e essas eu quase nunca vejo, moro longe, qualquer coisa como desculpa serve, de fato eu sou e estou muito ligado nos aspectos sociais latentes da paternidade e da infância do meu filhote e também procurando aliviar a tensão dos meus nervos lendo e exercitando algo que posso dizer ser de caráter espiritual. Preciso de um plano pra mim, outro pro meu filho e outro pra situação ímpar que estou passando no trabalho, tanto em casa quanto fora de casa. E por mais que eu tente ser fútil ou inútil, eu não consigo ou minha educação não permite que eu fique nessa situação por longos períodos sem que lembre e comece a ter remorso e pesadelos por estar sendo algo que não sou.
Está em todo lugar essa futilidade, não feche seus olhos pra isso. Mas onde se posicionar em tal momento histórico? E vale à pena ser fútil? De acordo com Niezstche, só a grande decadência espelhará uma grande ascendência pessoal. É preciso matar na alma aquilo que nos corrompe: sexo, inveja, ganância. Não sei e não fui de mergulhar fundo em coisas que me prejudicassem. Não me basta o fundo do poço se, para isso, eu precise me lambuzar de elementos e pessoas que não combinam comigo nem em uma realidade virtual. Está na Rua Augusta e em outras ruas pelo Brasil o sexo pago que não leva ao fim da porra seca. Está nos meios de comunicação mais abrangentes o fruto da cobiça e da inveja. A ganância é um traço humano descrito desde os tempos dos gregos do qual sei muito pouco. Confesso que, por não ser ganancioso, tenho tão pouco para um homem da minha posição. Mas foda-se.

sexta-feira, outubro 03, 2008

sobre como começa o sonho

lembro nitidamente de encostar a cabeça no travesseiro antes de dormir, descansar o corpo da gravidade e dos baques da rotina e esquecer de tudo; fechar os olhos, desligar a luz, aquele breu acolhedor e aquele silêncio que só o meu bairro possuía, só o atrito dos meus cabelos na fronha de algodão, aquele cheiro de amaciante acolhedor. lembro de ser uma criança que tinha muitos sonhos durante o sono, mas eu não sonhava acordado. depois de ouvir música egípcia na cabeça e ter uma revelação pessoal muito forte, uma revelação cujo teor seria útil até os dias de ontem, comecei a ouvir o barulho de aplausos todas as noites antes de dormir. Esse barulho parecia o de ondas do mar, incessantes e harmônicas e de uma simetria sonora caótica que parte da bagunça e chega ao uníssono como em uma explosão muito forte. Todos os dias eu ouvia esse mesmo barulho e no começo eu não reconhecia isso como aplausos. Eu achava que era coisa da minha mente. Muito tempo depois, perturbado pela idéia de que esse barulho não me abandonava, que teria de fazer sentido em algum momento, resolvi que ele seria esse barulho que eu ouvi quando fui a um show muito grande e me pareceu ser o mesmo barulho: o de muita gente aplaudindo ao mesmo tempo. Isso foi em 1995. Hoje em dia eu não ouço mais esse mesmo barulho e nem de longe eu lembro do sabor e do som dele.

quarta-feira, outubro 01, 2008

existência

é muito bom fazer parte da existência
que é uma resistência à morte
nasci
preciso continuar a existir
aqui
é muito profundo
nem sei definir